Drags Queens nas Olimpíadas de Paris e nosso culto ao ódio
- Aniervson Santos
- 1 de ago. de 2024
- 5 min de leitura

Olá meu povo, como vocês estão? Espero que estejam todos bem! Neste texto, irei abordar um pouco a respeito da polêmica em torno de uma apresentação artística na abertura das Olimpíadas de Paris, que aconteceu na última sexta-feira, dia 26 de julho.
Antes de iniciar o tema central dessa discussão, deixa primeiro perguntar: vocês estão cientes da polêmica em torno dessa performance? Bem, deixa eu contextualizar caso você não esteja sabendo do que se trata.
Na abertura dos jogos olímpicos em Paris, aconteceram diversas intervenções artísticas, entre elas, uma realizada por um grupo de Drag Queens. Muitos cristãos conservadores associaram essa apresentação artística àquela famosa obra de Leonardo da Vinci, chamada de "A Última Ceia", que retrata a última ceia de Jesus com seus apóstolos.
Porém essa apresentação que aconteceu na abertura dos jogos olímpicos de Paris, não tem nada a ver com essa obra de inspiração e conotação cristã, mas sim com outra obra, chamada de "O Banquete dos Deuses", feita por Jan van Bijlet, que retrata os deuses greco-romanos em uma festividade opulenta.
Parece um engano bobo, não é mesmo? Mas acredite em mim, não é! Os cristãos conservadores usaram dessa apresentação artística para, mais uma vez, produzirem um discurso de ódio contra uma parcela da população que já é marginalizada por outros motivos. O pior de tudo isso é que esse preconceito vem disfarçado com um discurso de "respeitem minha religião", como se a atitude de alguém pudesse ferir um princípio que deve ser da ordem particular, interna do sujeito.
Aí então eu te pergunto, a fé que você professa, a religião que você pratica, o deus em que você acredita, é tão frágil assim a ponto de serem destruídos por qualquer opinião contrária ou qualquer crítica ou não aceitação por parte de outras pessoas? Que tal você refletir sobre isso?
Bem, voltemos às críticas que a apresentação artística anda sofrendo por parte dos cristãos conservadores e digamos de passagem, sem conhecimento de história e de arte. Como eu disse, a apresentação protagonizada pelas Drag Queens nas Olimpíadas em Paris retrata a mitologia grega, de forma especial o deus Dionísio, conhecido por ser o deus do vinho, das festas, do teatro, da alegria, entre outros atributos.
E porque será que a figura de Dionísio, um dos deuses da mitologia grega afetou tanto o cristianismo? Antes de responder essa pergunta, deixa eu explicar, de forma bem resumida, quem é o deus Dionísio para a mitologia Grega.
Dioniso era uma divindade presente na religiosidade dos gregos antigos. Era conhecido como o deus do vinho, das festas, do teatro e da alegria. Ele estava muito relacionado com a alegria humana durante as festas e com o ato de se embebedar com vinho. Ele era conhecido como filho de Zeus e de uma mulher mortal. Zeus, deus dos céus e do trovão para os gregos, teve um caso extraconjugal com essa mulher.
Acredita-se que Dioniso já era venerado na Grécia durante o período micênico — por volta do século 14 antes de Cristo. O culto a Dioniso ficou marcado pelo consumo sem limites de vinho. Além disso, os participantes das celebrações entravam em estado de transe e participavam de orgias. O culto a Dioniso era influente na Grécia Antiga, e vários festivais eram realizados em sua homenagem.
Esse breve resumo sobre Dionísio já revela um pouco os motivos dessa apresentação artística afetar tanto os cristãos conservadores, não é mesmo? Afinal, Dionísio representa tudo o que a maioria das religiões desejam reprimir, especialmente as religiões cristãs.
Como bem disse o psicólogo Geovane Corrêa, Dionísio representa a liberdade sexual, ele foge dos padrões de gênero, está comprometido com a realização dos desejos mais carnais, se opõe a autoridade e a ordem, se fartura com sua prosperidade, além de se desligar do controle racional, se permitindo estados de êxtase através do vinho, entre tantas outras coisas.
Dessa forma, a figura de Dionísio, e sua representação por parte de outras figuras que já são marginalizadas socialmente, que são as Drags Queens e a homossexualidade de modo geral, traz a tona aspectos que são forçadamente escondidos nos porões da marginalização social. O grande dilema é que aquilo de humano que Dionísio representa em nós não pode ser controlado pelas regras morais que o conservadorismo quer controlar a todo custo.
A única forma de controlar nossos desejos, mesmo sendo aqueles mais incontroláveis, é, primeiramente, através do reconhecimento de que eles existem e são parte de nós. Não adianta negar seus desejos mais mundanos e impuros, pois eles não se desfazem ou serão controlados dessa forma. Quanto mais você negar que possui tais desejos, mais forças eles terão dentro de você e acredite, uma hora ou outra ele conseguirá ser realizado, mesmo que de forma bem escondida.
É importante dizer que a energia dionísica está presente em nossa sociedade e, é claro, presente em nosso mundo interior. A grande questão é que alguns de nós se permite viver algumas dessas energias e controlar outras, ou ao menos tentar, enquanto outros de nós, preferem negar que elas existem.
As críticas sofridas pela apresentação artística protagonizada pelas Drags Queens nas Olimpíadas de Paris mostra o quanto ainda rejeitamos e perseguimos aquilo que é diferente de nós, como se fosse uma ameaça. Como a própria arte Drag se recusa a permanecer nos padrões e moldes sociais é constantemente perseguida e anulada, assim como a própria comunidade LGBT também é perseguida.
Toda essa reação a essa apresentação artística revela uma defesa interna nossa, que é a projeção. Esse mecanismo de defesa chamado de projeção representa aquilo que está em nós, que faz parte de nós, mas que não aceitamos como tal e, portanto, perseguimos no outro. Como não reconhecemos que aquilo que rejeitamos está dentro de nós, projetamos no outro, para assim perseguir e tentar controlar ou eliminar.
Imagine uma projeção feita por um retroprojetor. A origem da imagem que aparece ampliada no telão vem de um computador, não é mesmo? É a partir do que está nos arquivos do computador que o retroprojetor funciona. Se não houver um arquivo para ser projetado, o retroprojetor não terá nada para exibir. Assim funciona o mecanismo da projeção descrito por Freud, aquilo que está dentro de mim é projetado para fora e ampliado. Estando fora, sendo projetado, eu procuro controlar. A questão é que eu preciso ter a consciência de que qualquer alteração que eu desejar fazer na imagem eu tenho que fazer no arquivo que está no computador e não na imagem que está sendo projetada no telão. Entendeu?
Bem, é isso gente. Espero que este pequeno texto possa te ajudar a refletir um pouco sobre a dinâmica psicológica que está por trás da polêmica dessa apresentação artística realizada pelas Drags Queens em Paris. Nada tem a ver com a perseguição a uma religião, tão pouco com desrespeito ao credo e fé de ninguém. Ela tem a ver com a representação do Olimpo, afinal é daí que surgem as Olimpíadas, não é mesmo?
E se uma intervenção artística tiver o poder de abalar sua fé, sua crença, a imagem que você tem de seu deus, ou seus princípios morais e religiosos é porque você não possui segurança naquilo que você crê ou então aquilo em que você crê não tem forças nenhuma para se manter de pé por si mesmo e precisa que os meros mortais o sustente. Já parou para pensar sobre isso?
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